Os cenários de grandes incertezas se intensificam agora, mas de alguma maneira sempre estiveram presentes.
Por um breve período, num passado recente, fez sentido para as organizações se estruturarem em torno da ideia de previsibilidade, planejamento, controle, se organizarem em torno de departamentos especializados, processos e metas também departamentalizados. Ou seja, funcionou por um bom tempo acreditar que os contextos, os negócios, a vida eram estáveis, controláveis e previsíveis.
Agora, isso não faz mais sentido. Isso não dá mais conta. Precisamos de novas premissas, novas maneiras de interpretar o mundo, o mercado e seus desafios complexos. E essas premissas já existem. E tem muita gente estudando, aplicando e aprendendo com isso, há muito tempo.
Uma dessas premissas tem a ver com o “entre”, as interdependências, uma teia de interações entre todas as pessoas e/ou variáveis e que se movimenta a todo momento em torno de padrões que tendem a se repetir.
Quando nossos clientes nos procuram para ajudar a lidar com um desafio complexo, onde há muita incerteza e não há clareza nenhuma de solução, um dos primeiros caminhos que escolhemos atuar tem a ver com essa premissa.
Não vamos fazer um diagnóstico para destrinchar e descobrir alguma causa raiz para o problema. Não vamos querer saber do que o problema é feito, nem o que o compõe.
O que vamos fazer é adicionar ainda mais complexidade a situação: vamos conversar com mais pessoas para sobrepor mais narrativas diferentes sobre o contexto, vamos observar as interações e interdependências, vamos adicionar mais contextos que não estão sendo considerados, vamos capturar indícios e protótipos de novas soluções que já começam a ser experimentados na “periferia” do sistema. E, ao sobrepor tudo isso, ao colocar essas narrativas e imagens e relações e protótipos um sobre o outro, começam a emergir padrões. Padrões narrativos, padrões emocionais, padrões relacionais, padrões de transformações em curso, padrões de silenciamento…
Esses padrões trazem consigo algumas possibilidades de solução a experimentar.
Quando esses padrões se tornam conscientes, nossa visão sobre as questões torna-se outra. Passamos a enxergar de maneira palpável caminhos possíveis de inovação e transformação. Além disso, podemos refletir sobre quais premissas, princípios, crenças sustentam esses padrões e escolher quais delas ainda fazem sentido, quais delas não fazem mais, quais novas premissas fazem sentido agora.
Não é uma conversa de certo ou errado, é uma conversa sobre o movimento de transformação em curso e como é possível navegar com ele.
Ainda mais conscientes sobre os padrões e premissas, podemos empreender ações e movimentos específicos e com muito potencial de provocar uma transformação ou inovação em toda essa teia de complexidade.
Calma, acho que acelerei muito. A gente começa por mergulhar em todas essas interações e descobrir os padrões complexos que se revelam ao sobrepormos todas essas informações. Fazemos isso através de diálogos 1:1, diálogos em pequenos grupos, observação de reuniões, workshops ou “passeios despretensiosos” pelos lugares onde as pessoas se cruzam. Ao revelar esses padrões, chamamos as pessoas interessadas/responsáveis por encontrar um caminho de transformação para apresentar os padrões e refletir sobre eles. E só essa reflexão já gera movimento e alteração desses padrões.
A sopa
A maneira mais simples que encontrei até hoje para explicar esse processo é a sopa.
Imagine uma sopa feita com uma grande diversidade de legumes e ela foi batida, formando um creme homogêneo. Essa sopa forma uma série de padrões de cor, consistência, sabor, perfume, temperatura, etc
Suponha que você não tenha gostado da sopa e queira mudá-la. Mas, você não sabe do que ela foi feita e nem como foi feita. O que se pode fazer para mudá-la? Como mudar o padrão da sopa para que ela fique mais gostosa?
Certamente, seria interessante descobrir do que ela foi feita e como ela foi feita. Mas, saber disso não mudaria a sopa, nem a faria mais saborosa. Seria apenas um desperdício de energia.
O que realmente poderia mudar a sopa?
Adicionar ingredientes. Somente adicionando ingredientes é possível mudar o padrão da sopa. Quem sabe, seu objetivo, para seu paladar seja transformar a sopa em algo mais avermelhado, com uma consistência um pouco menos pastosa, para parecer mais leve. Nesse momento, fica claro o padrão atual da sopa e também que movimento de mudança faz sentido empreender. Quem sabe faça sentido adicionar um pouco de beterraba, um pouco de água, bater de novo e perceber qual novo padrão emerge dessa experiência.
Ao incluir apenas 2 novos ingredientes, você consegue alterar todo o padrão da sopa. Porque esses ingredientes estão agora em interação com todos os demais e todos os demais vão responder a essa interação e isso produzirá um outro sabor, outra cor, outra consistência, outro cheiro…
Por isso, além de adicionar poucos ingredientes, é importante fazer aos poucos e ir observando o impacto que isso gera no padrão da sopa, para ela não passar do ponto, ou para descobrir que, quem sabe, algumas quantidades não estão alterando o padrão, ou mexeram em outras partes do padrão que você não queria que mudassem, como o sabor por exemplo. É um processo, ao mesmo tempo seguro, porque você conhece alguns ingredientes que fazem sentido incluir, e ao mesmo tempo experimental, porque você precisa observar as mudanças no padrão para ir alterando suas decisões ao longo do processo.
Meio óbvio né? Mas, não é. Pelo menos não é para as organizações.
Elas, ou seja, nós, aprendemos uma outra premissa de atuação. Onde precisamos acreditar que os ingredientes não interagem uns com os outros, onde incluir ou deixar de incluir um ingrediente irá impactar em uma parte da sopa, como se a sopa não fosse uma coisa só, fruto de muitas coisas que estão em constante interação e adaptação.
Por isso, é urgente olharmos para os contextos e problemas complexos com as lentes da ciência que estuda isso: a complexidade.
A complexidade não é complicada. Ela é apenas uma maneira diferente e mais potente de perceber e lidar com o contexto que vivemos hoje. Ela, na verdade, é bem simples. É como transformar uma sopa.
Assista um resumo desse artigo aqui: