Tenho me assustado com os atuais níveis de intolerância que venho observando nas interações entre pessoas. E não falo só da polarização nas redes sociais. No mundo do trabalho, não me recordo de já ter vivido um ambiente tão tenso e com tantas dinâmicas de desqualificação — e isso entre pessoas que, a priori, estão no mesmo barco e deveriam portanto, remar para a mesma direção. É um tal de um falar mal do outro, numa perseguição cega por culpados que até um consultor já calejado como eu se surpreende com a quantidade de conflitos de natureza visivelmente emocional e agendas ocultas que movem conspirações internas por poder, gerando, invariavelmente, sentimentos de exclusão de parte a parte — exclusão que, aliás, é o mais doloroso dos sentimentos, posto que nos priva exatamente do que nos torna humanos: o pertencimento.
Natural que, em tempos difíceis, haja um aumento da desesperança no ar. O acúmulo de incertezas sobre o futuro estimula o crescimento do medo — medo de perder o emprego, de não conseguir voltar a trabalhar, de não ter como cuidar de si e da família. E como medo para nosso sistema nervoso é sinônimo de perigo, viver continuamente dominado por ele aciona exageradamente nosso sistema reptiliano, responsável pelas reações automáticas diante de situações percebidas como de risco à vida. A repetida liberação da adrenalina necessária a nos colocar nesse estado de defesa, ao invés de nos proteger de ameaças, desequilibra nossa química interna, estressando nosso organismo em excesso.
Existem várias formas de reequilibrar os hormônios em nosso corpo, como fazer exercícios físicos, comer certos alimentos e, em casos extremos, repô-los por meio de medicação. Uma das maneiras mais simples e eficazes é a apreciação. Elogiar com sinceridade alguém estimula a liberação do “quarteto da felicidade”: endorfina, serotonina, dopamina e oxitocina. A pesquisadora Loretta Breuning, autora do livro Habits of a happy brain, explica que, quando o seu cérebro emite uma dessas químicas, você basicamente se sente bem.
A liberação de serotonina, cuja redução está associada à depressão, é acionada quando, por exemplo, lembramos de situações felizes. Verbalizar para outra pessoa suas qualidades é, assim, uma maneira poderosa de ajudá-la a se lembrar dessas situações.
Senso de pertencimento ajuda na produção das endorfinas, consideradas, por seu efeito analgésico, a morfina do corpo. Quando, portanto, nos sentimos amados ou transmitimos esse sentimento a outrem, liberamos bons níveis desse que também é chamado o hormônio do prazer e da alegria.
Já a oxitocina é um composto cerebral importante na construção da confiança necessária para desenvolver relacionamentos emocionais. Também é conhecida como hormônio do amor, devido ao seu papel para a melhora do humor, da interação social, diminuição da ansiedade e aumento da ligação entre parceiros. A melhor e mais simples maneira de estimular a produção de oxitocina é dar ou receber um abraço.
Além de dar abraços indiscriminadamente — o que por vezes me coloca em uma saia justa, especialmente diante de culturas, digamos, menos afetuosas -, sigo uma regra simples para me conectar às pessoas que aprendi com Stephen Gilligan, doutor em psicologia e professor de hipnoterapia Ericksoniana, e expressa por um mantra poderoso: “Touch me, teach me”. É um mantra porque precisa ser repetido muitas e muitas vezes para se tornar presente, na medida em que os convites para se fechar ao outro parecem vir em um número infinitamente maior do que os convites para se abrir. E é poderoso porque, na interação com alguém, praticar a escuta curiosa e sem julgamento é o primeiro passo para mover-se para uma relação empática. Não falo de colocar os sapatos do outro — o que não acredito ser possível -, mas de se permitir ser tocado pelo outro, pelo que o outro fala, pelo que o outro sente. É o que a doutora em ciências sociais Brené Brown explica em uma das palestras TED mais populares e que ela descreve como “o poder da vulnerabilidade”. Me abro para o outro e ele me ensina o que preciso fazer para também tocá-lo.
Mais do que os autores que leio, a vida me ensinou que o primeiro passo para conectar-me a alguém é por meio do reconhecimento de seus talentos e suas forças. Apreciar claramente as qualidades que consigo identificar em outra pessoa cria um fio que nos conecta. Quanto mais forte estiver esse fio, maior a chance de também poder falar abertamente sobre o que não apreciamos um no outro. Basta observar o que se passa em nossas relações mais íntimas. Muitas vezes dizemos coisas duras de serem ditas aos nossos amigos, mas justamente as dizemos porque os amamos, porque construímos uma relação de confiança entre nós, porque admiramos uns aos outros e conseguimos enxergar além da cortina de fumaça das primeiras impressões e das imagens preconceituosas.
Da próxima vez em que tiver que conversar com um pessoa com quem você tem dificuldade de conectar, identifique antes duas ou três qualidades que você admira nela. E só vá até ela depois de descobrir. Inicie a conversa reconhecendo essas qualidade. Experimente. Pode ser libertador.