A manchete do caderno de economia do Estadão, da última sexta-feira, dia 22 de janeiro, dizia o seguinte: “País fecha 1,5 milhão de vagas em 2015 e mercado vê risco de piora este ano”.
Sabemos que várias empresas já fizeram ou estão planejando fazer cortes, cortes de despesas, cortes de investimento e em especial cortes de pessoal — acredito ser crítico olharmos para esta questão de frente. Afinal, num momento de retração da economia, de frustração das expectativas de investidores e empresários, de tanta instabilidade política, social e econômica, cortar ou não cortar é uma importante questão! E se a decisão for cortar, como fazê-lo de forma inteligente?
Para mim, há uma lógica que serve como base para responder todas estas perguntas. A liderança de uma organização (e podemos entender aqui organização como empresa, mas também como família ou sociedade) têm algumas responsabilidades:
• Primeiro, maximizar a expressão do seu propósito, do motivo pelo qual a organização existe, o serviço que ela presta aos clientes e à sociedade. Para isto, os líderes têm que preservar a essência e a alma da empresa, pois é deste lugar que vem sua força original
• Segundo, há um compromisso com o futuro, com a perpetuidade, a sustentabilidade. A forma de fazer isto é, com um olho no futuro e outro no presente, buscar trazer valor para todo o ecossistema da organização: investidores, colaboradores, clientes, fornecedores, meio ambiente e comunidade. Esta é a única forma de gerar a perenidade da empresa — todos se sentirão conectados a ela e vão suportar o seu desenvolvimento.
Infelizmente, temos presenciado casos onde o principal motivador para o corte é simplesmente maximizar o resultado de curto prazo, pelo puro interesse de acionistas e do bônus dos executivos. E isto ainda feito de forma descuidada, tratando pessoas como “recursos humanos”, peças de uma máquina que podem ser descartadas a qualquer momento.
É uma cegueira conveniente! Mas pouco sabem estes líderes dos efeitos nefastos que vão colher: uma organização traumatizada e paralisada, perda da cumplicidade e da lealdade dos colaboradores que ficarem, feudos que buscam a autoproteção, desengajamento do pessoal, incapacidade de inovação e adaptabilidade a novos contextos, tudo o que uma empresa não quer num período de crise.
Com que cara vamos depois pedir pessoas protagonistas e criativas se as tratamos como crianças descartáveis?
Vamos dar um passo atrás. É claro que ninguém vai “escolher” a crise, mas sabemos também que a natureza da vida é expansão e contração (assim como nossa respiração) então sabemos que ela é parte natural do processo evolutivo do mundo.
E a história nos mostra que é em momentos de pressão e desafio que pessoas podem se unir, criar ideias extraordinárias e as sementes para um novo ciclo de criação e expansão são plantadas. Mas isto requer um time coeso, diálogo, cuidado com o outro, simplicidade e foco no essencial.
Muitas vezes, num momento de desafio, somos tomados pelo medo, pelo instinto de sobrevivência própria, e acreditamos que estamos sozinhos, que nossa existência ou identidade estão em perigo e precisamos lutar ou fugir. E às vezes isto é verdade mesmo, mas na grande maioria das vezes não — isto é somente uma ilusão pessoal, que nos leva a tomar ações de guerrilha, a partir de um pensamento de escassez.
Se partirmos da premissa que o universo é abundante e que o viver é uma pura expressão da beleza e da verdade através de nós (e que somos nós que julgamos os fatos como bons ou ruins), poderemos lidar com os desafios de outra perspectiva.
Se a vida estivesse certa, qual é o presente que ela está nos trazendo com esta crise? Como o sistema pode evoluir para ficar ainda melhor? Como podemos nos reinventar e continuar nos adaptando ao mundo? Como posso convidar as pessoas a fazerem parte comigo desta aventura provocativa que nos está sendo oferecida?
Um amigo meu que está numa situação financeira difícil me contou que pela primeira vez ele sentou com a esposa e as duas filhas para falarem sobre o assunto e, além de encontrarem uma solução viável para o equilíbrio do dinheiro, isto gerou uma qualidade de vínculo e uma nova experiência de família que ele não tinha tido antes.
Quando as pessoas sentem o convite genuíno para participarem como adultos de conversas, mesmo que difíceis, percebem a intenção positiva de preservar o sistema como um todo e o seu legado para a sociedade, e que o interesse de todos foi realmente levado em consideração, soluções criativas podem emergir e mais do que isto, um período difícil pode gerar uma união e uma conexão fundamental para a fase seguinte.
Após muito diálogo e com o olhar para o sistema como um todo, é possível que a saída de pessoas da organização seja o sacrifício necessário no momento. E cada empresa vai encontrar sua forma de viver isto, mas queria deixar alguns princípios que podem facilitar esta fase: seja verdadeiro na intenção e no discurso, simplifique os processos e a atuação da empresa ao essencial primeiro, confie na inteligência do sistema e lance o desafio ao grupo, trate as pessoas como adultas que podem inclusive ser parte da conversa de solução, atue com cuidado e compaixão (afinal poderia ser o seu filho ou filha do “outro lado”), honre e reconheça quem está se sacrificando pelo todo, dê espaço para a tristeza (o luto faz parte da vida), relembre todos do nosso propósito maior e do sonho que nos uniu; enfim, esteja presente, não fuja ou se esconda!
E se você é a pessoa que está saindo da empresa? Fique um pouco em silêncio para se conectar ainda mais à sua essência, seus talentos e sua paixão; se estiver triste ou dolorido, aceite por um tempo, não fuja — talvez seja a dor do crescimento e haja “diamantes escondidos na lama”; busque fazer parte de alguma comunidade, qualquer que seja — conecte-se; fale sobre o seu sonho e o que você busca, mesmo que você não tenha total clareza e seu discurso ainda não esteja “pronto”; tenha fé na vida e na abundância do Universo — depois da tempestade, sempre vem a bonança.
Mesmo que não pareça assim agora, esta pode ser uma grande benção que o universo lhe concedeu. Eu também vivo empático a você neste momento.
Cultivemos juntos a experiência e estou certo que colheremos os frutos da vida!
Mauricio Goldstein é sócio da Corall e escreve para o blog Gestão Fora da Caixa da Exame.