Entendendo porque gestão de desempenho está falida nas empresas
Semana passada dei uma aula no curso de RH e Sustentabilidade, que a Associação Brasileira de Recursos Humanos São Paulo está realizando com o objetivo de explorar as necessidades e oportunidades que emergem para os profissionais de gestão de pessoas na busca por negócios mais sustentáveis e um planeta mais resiliente.
Naquela manhã procurei explorar um dado da Pesquisa Global de Tendências em Capital Humano da Delloite em 2014, com 2.530 líderes de negócios e de recursos humanos em 94 países, que embora soubesse que os sistemas atuais de gestão de desempenho, meritocracia e remuneração não estão funcionando a contento aqui no Brasil, me saltou aos olhos ver que esse é um fenômeno global: somente 8% das empresas considera que seu processo de gestão de desempenho agrega valor para a organização, e 58% delas considera que o processo atual é um desperdício de tempo. Além disso, na opinião dos participantes, o modelo predominante de gestão de desempenho está, prejudicando o engajamento dos colaboradores, alienando as pessoas com alto desempenho e desperdiçando um tempo valioso dos gestores.
Fiz minha própria pesquisa sobre as possíveis razões para esse fenômeno a fim de empoderar os gestores de pessoas ali presentes para explorar novas possibilidades e co-criar suas próprias soluções, baseadas em pequenas mudanças que façam a diferença para as empresas, as pessoas e o planeta. Alguns insights de nosso encontro foram:
• Os modelos de gestão de pessoas não consideram que nosso inconsciente também vai para o trabalho conosco, junto com o consciente. Isso significa que pequenas sutilezas tais como a linguagem que usamos para dar feedback de desempenho tem tanto ou mais impacto em nossas emoções do que o próprio desempenho. O processo predominante atual de formalizar o feedback em uma reunião anual e fazer correlações diretas entre desempenho individual e remuneração também engatilham nas pessoas um estado de ameaça e insegurança, o que dificulta a construção de um ambiente de aprendizagem e engajamento.
• Outros aspectos de nosso inconsciente que impactam nosso sentimento, aceitação e a eficiência dos próprios sistemas de gestão de desempenho e remuneração foram codificados pelo autor e consultor David Rock no acrônimo SCARF de Status, Certeza, Autonomia, grau de Relação, e Fairness — Justiça! Os processos e rituais presentes nestes sistemas deveriam cuidar para que o senso de status, de clareza e direção dos diálogos de desempenho e remuneração, do respeito à necessidade de autonomia no trabalho, do senso de comunidade e do sentimento de justiça entre contribuição e retribuição sejam incorporados em seu desenho e prática.
• Outro aspecto importante que acho que ajuda a explicar a falência da gestão de desempenho tradicional é a interdependência crescente entre pessoas e áreas nas organizações. Na emergente economia do conhecimento, onde a complexidade das questões de negócios e o impacto da tecnologia evoluem cada vez mais rápido, cada vez mais o resultado das organizações é um fenômeno coletivo, onde cada área e pessoa contribui com suas habilidades e pontos de vista complementares que permitem ter decisões melhores. Assim, medir o resultado individual através de indicadores chave de desempenho torna-se um desafio cada vez maior porque qualquer que seja esse indicador, provavelmente ele é a soma da contribuição de várias pessoas dentro e fora da organização, diluindo-se assim o grau de influência e controle individual sobre este resultado. Neste sentido, a correlação entre esforço e contribuição individual e o resultado alcançado, ou seja, o senso de justiça final da pessoa e dos outros envolvidos no processo, é mais errático.
Essas são algumas ideias que acho que ajudam a aprofundar o olhar para a gestão de desempenho nas empresas. E você, o que acha? Que outras explicações você traria?
Vicente Gomes é sócio consultor da Corall Consultoria.