Se ninguém aguenta mais ouvir que a cultura come a estratégia no café da manhã e até a Brene Brown já transmutou o poder da vulnerabilidade na coragem de ser imperfeito, por que é que iríamos trazer outra vez esses dois temas por aqui?
Primeiro, porque a cultura segue sendo, no papo reto, a forma como as coisas acontecem numa organização e precisa, portanto, ser entendida para que possa ser influenciada.
Segundo, porque vulnerabilidade não é só um modismo para vender palestras ou consultoria. Vulnerabilidade é uma palavra que nos ajuda a lembrar que somos seres vivos imersos numa cultura que, muitas vezes, nega essa condição ao ainda se organizar em torno do paradigma da empresa que opera como máquina.
E terceiro, porque, a ilusão de que é possível operar como uma máquina perfeita é perpetuada pelos exemplos de uma liderança heróica que se sacrifica pela empresa e pela lógica de crescimento infinito, que basicamente está destruindo o planeta.
Esse comportamento é continuamente reforçado por sistemas de recompensa que premiam o saber e o acerto, e não a dúvida, o questionamento, a incerteza, o erro, enfim, a aprendizagem.
O resultado é a valorização da liderança que é campeã em tudo, uma imagem impossível de ser sustentada e que afeta a saúde não apenas das equipes, submetidas a réguas cada vez mais altas, mas a própria liderança.
Segundo uma pesquisa conduzida em 2022 pela Slack com 10 mil pessoas em diversos países, 43% dos gestores e 40% da força de trabalho geral se diziamm esgotados profissionalmente e com alto risco para burnout.
Diante desses dados, o que a maioria das empresas faz?
Contrata palestras motivacionais e programas de qualidade de vida.
O que, de verdade, elas deveriam fazer?
Mexer nas condições que geram os padrões do super-heroísmo tóxico que leva ao burnout.
Por exemplo, evoluir os sistemas de recompensa para reconhecer o erro e o não saber e, assim, ao mesmo tempo em que se estimula o padrão de aprendizagem, se estabelece um clima de trabalho mais favorável à vida humana.
Recentemente, na reunião de fechamento de um processo de mentoria, onde estavam a mentee e sua líder, depois de mediar uma conversa para reconhecer avanços e novas oportunidades de desenvolvimento, olhei para aquelas duas pessoas e, de repente, não as vi mais separadas pela hierarquia.
Pude reconhecer em ambas a pressão de uma performance impecável, construída e sustentada por meio de conselhos e feitos certeiros, e a única coisa que me ocorreu foi recomendar que experimentassem entre elas um espaço seguro onde poderiam trazer mais dúvidas do que certezas, dizer mais não sei do que deixa comigo.
De repente, naquele encontro de três pessoas comungando do sonho de poder ser elas mesmas, seguiu-se um silêncio que suspendeu o tempo e revelou, por nossos olhos úmidos, o quão difícil e o quão emergente era colocar isso em prática.
Depois de alguns segundos, a líder disparou: que tal começar agora?