“Uma cultura muito forte, com muita experiência, tende a excluir o jovem inexperiente. O principal papel da liderança é cuidar do novo, é fazer com que o jovem seja protegido para que tenha o tempo necessário para se integrar na cultura local, adquirir conhecimento e começar a lidar de igual para igual com os mais antigos”.
Em quase uma hora de entrevista ao blog da Corall concedida em seu escritório, em São Paulo, ao sócio da consultoria, Mauricio Goldstein, o engenheiro Fábio Schvartsman, diretor geral da Klabin, compartilhou sua visão sobre temas como liderança, sustentabilidade e inovação, contou qual foi a estratégia que adotou para alcançar resultados muito positivos desde que assumiu o comando da companhia, há cinco anos, e falou também sobre os desafios futuros, como a inauguração de uma fábrica de celulose no Paraná no mês de março que fará a empresa dobrar sua capacidade de produção.
“Temos lutado para mudar de uma cultura de igrejinhas para uma cultura amplamente participativa onde todos trabalham juntos e o exemplo vem de cima. O único jeito de haver jogo de equipe é que todos se exponham. Inclusive eu mesmo.”
Confira os principais trechos da entrevista.
A Klabin é uma empresa centenária. O que na sua opinião a faz se perpetuar por tantos anos? Qual é o propósito maior da Klabin no planeta que a fez sobreviver?
FS — O ponto peculiar a respeito da Klabin é que o controle desta companhia pertence à mesma família desde a origem, há mais de 100 anos. É extremamente incomum a mesma família conseguir se entender e as gerações subsequentes manterem este entendimento de tal forma que a companhia continue sendo a mesma companhia.
Existe o compromisso da família com a sobrevivência, com a permanência da companhia, o que ajuda a exercer seu papel de maneira íntegra, a investir pensando no futuro e não no resultado do próximo trimestre, mas sim no resultado lá na frente.
Seu papel no mundo a torna única porque já nasceu com uma preocupação de sustentabilidade. Esta questão de tratar bem a natureza está nos primórdios da Klabin. Há mais de um século, quando os Klabin migraram para o Brasil, eles já entraram na atividade florestal e posteriormente na indústria do papel com uma enorme preocupação com a preservação.
A Klabin preserva quase 50% de suas áreas e utiliza produtivamente os outros 50%. É assim desde o início. É herança de gerações. Na passagem de bastão de geração para geração vai no DNA a cultura da preservação do meio ambiente e do cuidar do entorno, a preocupação social. A Klabin tem um papel muito construtivo. Acho que isso está na base de sua sobrevivência por um período tão longo.
“Existe o compromisso da família com a sobrevivência, com a permanência da companhia, o que ajuda a exercer seu papel de maneira íntegra, a investir pensando no futuro e não no resultado do próximo trimestre, mas sim no resultado lá na frente.”
Qual o balanço que faz de 2015 para Klabin?
FS — 2015 foi um ano extremamente difícil para economia brasileira. E para a Klabin exigiu um esforço enorme para se adaptar à conjuntura. A Klabin é reconhecida como uma empresa flexível, que tem possibilidade de atuar em vários mercados, mas isso é teórico. É bem mais difícil quando se enfrenta quase um colapso do mercado interno que obriga a esfriar as vendas no mercado doméstico e acelerá-las rapidamente no mercado externo. E logramos isso com sucesso. No quarto trimestre, antes da inauguração da nova fábrica, nossas exportações em volume evoluíram 52% em comparação ao mesmo período de 2014. A companhia de fato aproveitou a oportunidade do câmbio no mercado externo e foi bem sucedida. Foi um grande ano para Klabin.
A Klabin está fazendo um grande investimento no projeto Puma (fábrica de celulose no Paraná)? Qual a expectativa da empresa para os próximos anos?
FS — O Puma é um investimento gigante de 8 bilhões de reais. A fábrica será inaugurada em março e agrega muito para a companhia. A Klabin estava em um beco sem saída porque tem um modelo de operação integrada com papéis. Começamos na árvore, passamos pela celulose e chegamos até a conversão em embalagem final.
Estávamos consumindo 100% da celulose e não tínhamos como avançar. E o mundo veio mudando. A escala de produção de celulose cresceu mundialmente. Tínhamos uma capacidade de 1,7 milhão de toneladas, que hoje em dia é uma escala mínima frente a nossa demanda. Se não fizéssemos um investimento gigante não seguiríamos mais nosso modelo de integrar o mercado de papéis e embalagens no mundo.
Em um primeiro momento iremos vender celulose para o mercado e ao longo do tempo nossa expectativa é integrar a produção de celulose em papéis, completando um período de 10 anos de crescimento contínuo. Estamos no 18o trimestre consecutivo de evolução positiva de faturamento. Estamos na metade do caminho. Vamos ter que suar muito a camisa nos próximos anos.
“Não acho que as empresas sejam objetos de revoluções. Empresas são objetos de evoluções.”
Quanto a companhia vai crescer com o projeto Puma?
FS — A companhia produziu em 2015 aproximadamente 1,9 milhão de toneladas. Em 2016, com o início do projeto, vamos chegar a quase 3 milhões de toneladas. Em 2017 alcançaremos 3,5 milhões de toneladas. E depois, com a integração em papéis, continuaremos crescendo. No final da década devemos superar 4,5 milhões de toneladas de capacidade. A companhia levou 110 anos para bater 1,7 milhão de toneladas e em 5 anos vai atingir mais de 4 milhões. Iremos fazer mais de 100 anos em 5.
Houve um crescimento significativo no valor de mercado da empresa desde que você assumiu seu comando. A Klabin foi a grande campeã do anuário Valor 1000 no ano passado. Conte um pouco sobre sua chegada na Klabin e a transformação que vem promovendo na empresa.
FS — Não acho que as empresas sejam objetos de revoluções. Empresas são objetos de evoluções. A Klabin evoluiu ao longo dos últimos anos. É uma companhia centenária e, por isso, tem que ter uma cultura muito forte. Não se enfrenta uma cultura muito forte. Na verdade, você adapta, evolui esta cultura. Creio que a percepção correta que tivemos foi entender que o objetivo não era fazer revolução. Ao contrário, era preservar os traços positivos da cultura e acrescentar outros valores a estes traços.
Como isso se traduziu na ação? Em primeiro lugar, com as mudanças das pessoas na companhia. Não que tenhamos apagado o passado. Continuamos trabalhando com as mesmas pessoas que aqui estavam e que tinham condição de entregar o resultado esperado. Foi possível ir modificando a preocupação destas pessoas, fazendo com que fossem mais focadas em resultados.
Quebramos as paredes. Juntamos todos os diretores em uma sala grande, que é um modelo consagrado e que faz uma diferença enorme. Uma segunda mudança foi no modelo de remuneração, agora voltado para resultados. As pessoas reagem a incentivos. Pela primeira vez nesta companhia fizemos pagamentos em ações com certa agressividade e adotamos uma remuneração variável com base em metas bastante fortes.
“O principal papel da liderança é fazer com que o jovem seja protegido para que tenha o tempo necessário para se integrar na cultura local, adquirir conhecimento e começar a lidar de igual para igual com os mais antigos.”
Qual o papel da liderança no papel de desenvolvimento das pessoas na Klabin?
FS — É cuidar do novo. Uma cultura muito forte, com muita experiência, tende a excluir o jovem inexperiente. O principal papel da liderança é fazer com que o jovem seja protegido para que tenha o tempo necessário para se integrar na cultura local, adquirir conhecimento e começar a lidar de igual para igual com os mais antigos. As empresas, de maneira geral, estão com o corpo de pessoal muito envelhecido. E a Klabin não era exceção. Dá trabalho trazer o jovem e o resultado demora pra acontecer.
Como avalia a inovação do uso da floresta?
FS — Estamos ainda tateando nesta questão. Em primeiro lugar, a Klabin achou seu caminho através do projeto Puma. Quando a empresa não sabe para onde vai fica batendo cabeça. Hoje a Klabin inteira sabe para onde vai. A preservação da floresta passa a ser algo não só desejável, mas necessária e diria que fundamental.
Neste sentido, a companhia está colocando de pé agora um grande centro de inovação perto da fábrica de Monte Alegre, que deverá ser o caminho da empresa do ponto de vista tecnológico. Pretendemos desenvolver todas as soluções possíveis da nossa matéria prima florestal, a começar pelos químicos que vêm da madeira, que vamos fazer um uso potencial profundo e que irá agregar bastante ao longo dos anos.
Para finalizar, qual enxerga ser o próximo passo na evolução cultural da empresa para que seja ainda mais bem sucedida?
FS — Mudamos a maneira de trabalhar para produzir resultados muito melhores para a companhia. Mas o que vem pela frente é totalmente diferente. Essa empresa irá dobrar de tamanho e, consequentemente, tudo irá dobrar. Iremos introduzir gente nova em todos os níveis, inclusive no nível de gestão, o que é um choque cultural relevante que não pode ser subestimado.
A Klabin passará a desempenhar um papel muito relevante em operações de M&A no setor de papel e celulose, o que significa que as pessoas que temos hoje terão que fazer a integração e a gestão de outras empresas, o que é outro grau de complexidade.
O que fizemos até hoje foi o fácil. Difícil é o que vem pela frente. E é daí que vem o desafio e a nossa motivação. Temos que juntar todos pra pensar. Não acredito em estrelas. Acredito em jogo de equipe. O que faz uma companhia melhor que outra é ter um time que joga junto, que pensa junto, que encontra soluções diferenciadas juntos.