Em determinados momentos de suas carreiras, muitos dos meus amigos pensam em migrar de seus cargos executivos para o de consultor e me perguntam quais são os principais desafios desta transição. Esclareço que neste artigo, quando falo da profissão, me refiro a um consultor-empreendedor, independente ou em rede, aquele que trabalha sozinho ou em um pequeno grupo e que é responsável individual ou coletivamente por seu resultado — leia-se, não é empregado de consultoria e nem possui salário fixo.
Esta transição é o sonho de muitos executivos que almejam a liberdade, autonomia e maior autoria em seus trabalhos. Não ter chefe(s), não ter que se submeter a uma estrutura ou a regras da empresa, férias quando quiser… Parece um sonho de consumo! Entretanto, muitos se deparam com desafios que nunca imaginaram quando eram empregados de uma grande empresa.
A partir da minha própria experiência como consultor, quero compartilhar três competências críticas para o sucesso em seu empreendimento:
O senso de dono: Quando fiz a transição de um cargo executivo em uma multinacional responsável por uma área de Desenvolvimento Organizacional global para o trabalho em uma consultoria em Transformação Organizacional, um amigo me perguntou: “No fundo, você faz a mesma coisa que antes, não é?”.
Respondi que antes eu era apenas o cozinheiro de um restaurante estrelado e agora era seu dono e cozinheiro — tinha que ter várias perspectivas ao mesmo tempo. Além de cuidar para que o prato saísse com a mais alta qualidade, agora precisava me preocupar com o design e a limpeza do salão, a compra eficiente e a qualidade dos ingredientes, da marca, do marketing, das vendas e das áreas de suporte, como finanças, TI (onde está a pessoa que vem arrumar o meu computador quando esse quebra?) e RH, se houver alguém mais trabalhando comigo. E é preciso fazer isso construindo redes de relacionamento. Tudo, sem abrir mão da boa cozinha, sem a qual um restaurante não resiste. Tudo ao mesmo tempo! Acredito que a maioria de nós tenha um certo senso de dono então é uma questão de aprender competências técnicas nas quais temos menos experiência ou facilidade e ser estratégico, intuindo no que dar foco a cada momento.
O foco no cliente: Eu acreditava que tinha esse foco na empresa, pois já tinha uma função de suporte e meus clientes estavam satisfeitos. Mas, percebi que o cliente interno na verdade tem pouca opção de não “contratar meu serviço” e que existe uma acomodação natural. Ter foco no cliente externo quando se está no mercado aberto é algo completamente diferente. É realmente necessário possuir a escuta atenta, buscar compreender a real necessidade do outro, cultivar uma presença profunda, ser criativo na solução e engajar em diálogos constantes de evolução, pois o cliente realmente tem muitas opções e vota com sua escolha, momento a momento.
A gestão emocional (a mais desafiadora de todas): Sabe aquela sensação de estar concorrendo a um novo emprego e não ser escolhido? Pois bem, ser consultor é sentir isso constantemente. É ser chamado para um projeto urgente, trabalhar noites ou finais de semana para fazer sua melhor proposta e nunca receber uma resposta. É às vezes passar meses sem fechar um projeto, sem receber. É ter resiliência para sustentar a frustração em várias destas situações e outras.
Kevin Cashman, autor renomado de livros sobre liderança, me deu o seguinte conselho quando decidi fazer a transição: “Todo dia quando acordar lembre-se porque você escolheu ser consultor e da paixão que se tem simplesmente em fazer este trabalho e esqueça o resultado — este virá como fruto do bom trabalho”.
Para mim, é como me exercitar: tenho que focar no prazer de fazê-lo e confiar que os resultados virão, sem ficar obcecado com métricas a cada minuto. Há momentos de muita provação na profissão, mas a recompensa de perceber o impacto em outro ser humano ou na organização é gratificante. É fundamentalmente ter paixão pelo servir e ter fé na vida, além de querer ser desafiado constantemente.
“Todo dia quando acordar lembre-se porque você escolheu ser consultor e da paixão que se tem simplesmente em fazer este trabalho e esqueça o resultado — este virá como fruto do bom trabalho”.
É incrível como o cliente e o mercado respondem ao seu estado de espírito. Portanto, cultivar seu centramento, tranquilidade e energia positiva faz toda a diferença. E quando não der certo e você se sentir desanimado, angustiado e sem energia? Paciência e aceitação do seu momento são a solução. E atenção para o que se pode aprender a cada instante com a experiência de agora — tudo é útil. E saiba que isto vai passar, sempre passa!
Como qualquer empreendedor, é preciso plantar para depois colher, investir para depois se beneficiar. Johnson, outro amigo consultor americano, me contou que no seu caso e de muitas pessoas que conhece, os primeiros dois anos de qualquer empreendimento são os mais desafiadores. Segundo ele, parece que há um muro e às vezes uma simples dúvida se aquilo vai dar certo faz muitos desistem. São bem-sucedidos aqueles que conseguem ultrapassar esta barreira natural e continuar conectados a seu propósito de ajudar ao outro.
Então, você quer ser um consultor? Consultoria (ou empreendedorismo) não é uma alternativa a um emprego, mas sim uma vocação. Pergunte-se se este é o seu chamado da vida agora e, se for, cultive a mente de um aprendiz e você sentirá a força e a resiliência necessárias para ter sucesso.