Quem quer sucesso?
Quem quer sucesso? Ter ou Ser? Essa dualidade marca o discurso ‘moderno’ desde os velhos tempos da, também já velha, contracultura, passando pelo new age, musiquinha de cachoeira, passarinhos e outros sons da natureza doce, maternal, jeitosa, harmoniosa e acolhedora (e, cá entre nós, chata!).
De lá para cá os roqueiros cafajestes e as duplas country e folk boazinhas envelheceram — e enriqueceram. Idem os novos, os velhos, enfim, todos os bahianos… Os filhos do hippies viraram yuppies, que produziram os ditos geração “x”, que geraram filhotes apenas denominados “y”, culminando com a atual confusão XX, XY, X what?
E volta e meia o dilema de “ter ou ser” emerge à baila, como fosse uma big novidade.
Sabe-se lá porque, de repente, uma turma resolve abdicar das SUVs e encara chuva e frio montada numa bike ou numa Lambretta, bem vintage. Mas outra turma continua grudada nos tais carrões, cheios de telinhas coloridas e airbags.
É o “ter ou ser” redivivo.
Uma bike na mão e uma ideia na cabeça, poderia ser o lema dos ex-SUVs netos do Cinema Novo. Monte numa bike e salvarás o mundo. Ou monte numa Lambretta e serás o hype do pedaço.
Que tal mudar o dilema?
Melhor ainda: que tal abandoná-lo
em favor de uma nova formulação?
Pouca gente se dá conta de que “ter ou ser” é uma dualidade discutida há mais tempo. Estava presente nas origens da filosofia ocidental, dos gregos aos romanos, seguidos de perto por uma honrosa fila de pensadores cristãos para quem a salvação estava em ser fiel, ou ter fé, acima de tudo. Fé era a única coisa a ser “tida” para alguém “ser”. Ou seja, até as revoluções burguesas do séc XIX não havia muito esse papo de “ter”. Todo mundo “era”: nobre, religioso, soldado, pobre ou, apenas, ninguém. Praticamente a vida inteira. Havia muito pouca mobilidade, e para muito poucos.
Para quem nascesse nobre, a nobreza era inerente ao seu ser. Mesmo pobre e miserável dizia-se que um rei “nunca perde a majestade”. Tanto que os bolcheviques precisaram eliminar fisicamente os Romanov, a família toda, de tanto medo de que seu ser prevalecesse sobre toda uma revolução. Já quem nascia escravo, estava condenado. Quando muito poderia virar “ex”-escravo. Homem livre, só quem nascia livre. E assim por diante.
A burguesia nascente derrubou essa ordem de castas e estamentos. Para horror das nobrezas decaídas, os burgueses enricaram e começaram a comprar títulos. Depois, nem isso. Para que? Decapitados os reis, passou a valer o poder conquistado por méritos e obras. E grana.
Que tal mudar o dilema? Melhor ainda: que tal abandoná-lo em favor de uma nova formulação? Que tal adotarmos o “fazer e o estar”?
Pronto! Ninguém mais se define por “ser”. Afinal de contas, o “ser” expressa antes de tudo por imobilidade e conquistas não conquistadas.
O “ter” também já se gastou: a diferença entre um idiota e um idiota com dinheiro (e uma SUV) é apenas o dinheiro. Tire-se o dinheiro e sobra apenas um idiota (com uma SUV)…
Já “fazer e estar” nos trazem novos valores: a pessoa se define pelo que faz e pela forma como está no mundo. As ações e a forma como foram empreendidas, e suas consequências, podem passar a definir quem é quem. Não importa onde se tenha nascido, onde se diplomou ou quanto dinheiro e bens tenha amealhado.
Que tal passar a definir e reconhecer — e recompensar! — pessoas por suas contribuições e pela forma como as constroem: o fazer e o estar.
Que tal?
Agora transponha essa ideia para o ambiente corporativo. Revise os crachás, metros quadrados, seleções por “escola de 1ª. linha”, vaga na garagem e outros signos de status e posições de poder. Que tal passar a definir e reconhecer — e recompensar! — pessoas por suas contribuições e pela forma como as constroem: o fazer e o estar.
É simples. Pense nisso ao estruturar suas políticas, seu pacote de recompensas e seu programa de bônus.
Pode não ser fácil, mas vale a pena tentar.
Nelson P. Chapira é prestador de serviços em gestão e desenvolvimento de pessoas.