Remuneração variável pode ser vista como um incentivo ou uma forma de recompensa. E muitas vezes é uma combinação de ambos.
- Incentivo pressupõe que sejam definidas metas no início do período e o grau de atingimento das metas ao final do período impactará no valor a ser pago. Assim, você é incentivado a buscar determinados resultados.
- Já recompensa, não necessariamente está vinculada a metas pré estabelecidas, mas ao final do período recompensa-se indivíduos ou grupos pelos resultados atingidos. É uma forma de reconhecer a contribuição de todos para os resultados.
Os conceitos de incentivo e recompensa em si são válidos, porém aspectos muito relevantes têm sido esquecidos ou sua importância minimizada no desenho dos planos:
- Sistemas de curto prazo podem comprometer a sustentabilidade da empresa em todos os seus aspectos: financeiro, ambiental, social e cultural; tendo em vista o desejo de ter resultados muitas vezes a qualquer custo, como por exemplo, decidir postergar manutenção das máquinas para conseguir cumprir metas de produção, ocasionando assim prejuízos futuros ou danos ao meio ambiente
- No Brasil, o percentual que a remuneração variável representa no pacote anual, principalmente para cargos de liderança, é muito alto, podendo representar mais de 50%. Isto reforça ainda mais a visão de curto prazo em detrimento da sustentabilidade dos resultados
- O sistema de metas das empresas está muito departamentalizado, desarticulado e subestima a interdependência entre as áreas para o sucesso da empresa. Ex.: Área comercial tem meta de aumento nas vendas que para ser cumprida requer investimento em marketing, mas marketing por sua vez tem metas de redução de verbas em eventos…ou seja para uma área atingir seus resultados a outra não conseguirá.
- Os modelos atuais, valorizam o indivíduo — “herói”, em detrimento da cooperação, atribuindo grande peso a metas individuais. Ex.: Um time de R&D desenvolve um novo produto, mas como boa parte da variável estava vinculado a avaliação de desempenho por curva forçada, alguns recebem muito e outros pouco; sendo que na verdade o resultado foi fruto de um esforço coletivo.
- Variável como forma de incentivo para atividades mais complexas pode ser nocivo para a inovação, conforme estudos recentes descritos por Daniel Pink no livro motivação 3.0. Já para atividades repetitivas a remuneração variável pode sim atuar como um incentivo.
- As empresas desconsideram o contexto de mercado, que muitas vezes é chave para os resultados atingidos. Ex. Crise econômica, entrada de um novo competidor, falência de um competidor e outros. Estes eventos podem afetar os resultados finais; porém como as metas estabelecidas no início do período não são revistas a luz do contexto externo, acaba-se por sofrer o impacto seja ele bom ou ruim. Tipicamente quando o mercado ajudou, ninguém se recente, porém quando o mercado apresentou desafios extras, todos se sentem injustiçados.
- Já os incentivos de longo prazo, são menos impactados pelos itens descritos acima, porém no Brasil ele está restrito na grande maioria das empresas a altos executivos que possuem como responsabilidade o desenho e a implementação de estratégias de médio e longo prazo.
Estas fragilidades, não significam que remuneração variável deveria ser excluída das práticas das empresas, mas sim que o desenho requer muito mais cuidado do que se tem adotado hoje.
Muitas empresas buscam na remuneração variável, uma forma de melhorar a produtividade e reter pessoas.
A melhoria da produtividade, muitas vezes requer inovação e já vimos acima que recompensa financeira pode ser mais prejudicial que benéfico quando utilizada como incentivo. Mas se for utilizado um modelo de recompensa e não incentivo, pode surtir um efeito positivo a posteriori.
Para melhorar a produtividade, muitas vezes é necessária uma reflexão de vários aspectos: Nosso propósito está claro? Temos os recursos e sistemas necessários para inovar? Nossa cultura permite o erro para o aprendizado? Perguntas como estas são muito relevantes e nos lembram que nem tudo se resolve só com dinheiro.
Já o tema retenção, levanta uma questão importante. Queremos manter alguém que não está engajado? Pois a promessa financeira pode até segurar temporariamente, mas não garante o engajamento. Este sim, deveria ser o foco de atenção. Um sistema de variável desenhado para servir de algemas de ouro, deve ser repensado à luz do que isto de fato significa. Na verdade, o que está por traz deste desejo é que a pessoa de fato queira permanecer e não se sinta obrigada. Sendo assim, deve-se também ampliar a questão para aspectos não financeiros como: existe oportunidade de desenvolvimento, autonomia e realização do propósito pessoal na empresa?
Vejo a importância deste tipo de reflexão, pois muitas vezes busca-se a resolução de todos os problemas com dinheiro e na verdade ele é importante, mas deve ser considerado como um item a mais na relação das pessoas com as empresas.
Sendo assim, remuneração variável, quando bem estruturada com outros subsistemas e cultura e estratégia da organização, pode ser um instrumento de impacto positivo para a empresa, seus funcionários, acionistas e demais partes interessadas.
Alessandra Almeida é sócia-consultora da Corall Consultoria