As atividades profissionais que você desempenha hoje existirão daqui a 10 anos ou 15 anos? Serão realizadas da mesma forma que são feitas hoje? Para grande parte dos profissionais, a resposta dessa pergunta é “Não”! E não me refiro aqui simplesmente a profissionais de atividades industriais que serão substituídos pela automação, por meio de robôs. Muitas profissões especializadas, que requerem muito estudo, passarão por mudanças profundas nas próximas décadas. Muitas delas praticamente desaparecerão ou ficarão restritas a um número muito menor de pessoas.
O iPhone, primeiro smartphone do mercado, não existia ainda há 10 anos. Foi lançado em 2007. Tudo o que fazemos hoje através de aplicativos em nossos smartphones, como compras online, traduções imediatas, e mobilidade urbana, para citar alguns poucos serviços, simplesmente não estava disponível há menos de uma década. Quantas posições no mercado foram criadas e outras deixaram de existir por causa dos novos fluxos sociais e econômicos a partir desta inovação?
E esta notícia é ruim? Para o conjunto da população, a notícia é muito boa pois passarão a ser oferecidos melhores serviços e produtos a preços mais competitivos. Obviamente, para quem hoje desempenha estas atividades que serão transformadas ou simplesmente deixarão de existir, a vida não ficará fácil, pelo menos por um período de adaptação. Estas pessoas serão convidadas pela Vida a se reinventar, a abandonar o que faziam, do jeito que faziam e a procurar novos caminhos. E, como sabemos, este processo para quem o vive não é fácil.
Há poucas semanas, vivi uma situação que me deixou bem reflexivo e com uma grande dose de empatia. Recebi de um taxista amigo, que foi um grande parceiro no período em que minhas crianças eram menores, uma mensagem via WhatsApp que anunciava corridas com 20% de desconto. Certamente, depois da chegada do Uber, a vida dos taxistas ficou bem mais difícil e com menores rendimentos. Senti uma dorzinha no coração pensando nas possíveis dificuldades financeiras que este amigo estaria passando. Mas, por outro lado, quando penso em como a vida de minha família ficou mais fácil depois da chegada deste serviço, reconheci que a sociedade como um todo se beneficiou bastante.
A cada dia, os exemplos destas mudanças e impactos nas atividades profissionais se tornam mais abundantes. Soube outro dia que os relatórios financeiros que são enviados às bolsas de valores a cada trimestre já podem ser feitos por algoritmos. Antes, obviamente, um grupo de analistas e controladores financeiros ficava responsável por sua elaboração. Na medicina, muitas atividades de diagnóstico de doenças que eram feitos por médicos especialistas passam hoje a ser desempenhadas com muito mais rapidez e acuracidade. Por exemplo, já há algoritmos para analisar e identificar casos de retinopatia diabética e, com isso, o tempo dos oftalmologistas pode ser redirecionado em outras atividades.
Pesquisadores da Universidade de Oxford realizaram um estudo sobre o futuro do trabalho e concluíram que quase metade dos atuais empregos corre o risco de ser automatizado por máquinas. O “aprendizado de máquina”, um ramo da inteligência artificial, permite que máquinas aprendam com dados e imitem algumas coisas que os humanos fazem. Hoje, a correção de redações de ensino médio já pode ser feita por algoritmos, com alta equiparação com as notas que são dadas pelos professores. Uma máquina pode ler milhões de redações ou examinar milhões de olhos em poucos minutos. O ser humano não tem condições de competir com máquinas quando se trata de tarefas frequentes e volumosas. As centrais de atendimento das operadoras telefônicas, neste sentido, estão com seus dias contados.
Trabalhei muitos anos na área de Recursos Humanos e uma posição chave em grande parte das empresas é a chamada de “Business Partner” ou Consultor de RH. Hoje, parte das atividades destes profissionais é dedicada a esclarecer clientes internos sobre processos de gestão de pessoas e aconselhamento. Pois bem, conversava outro dia com um amigo que trabalha na área de tecnologia e ele me contou que já estão sendo desenvolvidos algoritmos que poderão esclarecer várias dúvidas destes clientes. Desta forma, o cliente poderá ligar para uma central e ter acesso rápido à solução de boa parte de suas dúvidas. Obviamente, não me refiro aqui a questões mais delicadas onde a dimensão e troca humana se fazem necessárias, mas o tempo dedicado a grande parte das atividades rotineiras destes profissionais, ligadas a orientação, poderá ser liberado para se que se foquem em assuntos mais estratégicos como gestão da mudança e da cultura organizacional.
Há, no entanto, espaços onde as máquinas e algoritmos não conseguem competir com os seres humanos. Máquinas precisam aprender através de grandes volumes de dados passados e não conseguem lidar bem com coisas que não viram muitas vezes antes. Seres humanos não, pois temos a habilidade de conectar ideias aparentemente díspares para resolver problemas nunca antes enfrentados. Um exemplo interessante foi a criação do forno micro-ondas, quando um físico que trabalhava com radares durante a 2ª guerra mundial, a partir da observação de que o magnetron era capaz de derreter sua barra de chocolate, foi capaz de associar conhecimentos totalmente distintos como radiação eletromagnética e culinária.
Teremos a frente anos muito interessantes, com novas tecnologias trazendo mudanças dramáticas em todo mundo. Acredito que a população do planeta como um todo se beneficiará tremendamente com todas as inovações disruptivas que serão introduzidas e que afetarão profundamente nosso dia-a-dia. Nossos ambientes de trabalho serão também amplamente impactados e muitas das atividades e mesmo posições atuais não mais existirão nos próximos anos. Tarefas repetidas, mesmo as relacionadas a conhecimentos específicos profundos, poderão ser trabalhadas por máquinas e algoritmos, com alta qualidade e custos mais baixos. É um caminho sem volta.
Neste contexto, vale a reflexão sobre o quanto de criatividade, inovação e conexão humana temos e pretendemos desenvolver nas nossas atividades profissionais, pois neste espaço somos insubstituíveis.
Ney Silva é sócio consultor da Corall e escreve para o blog Gestão Fora da Caixa da Exame.